"E as companhas e os bancos trabalhavam para a sua própria ruína e não sabiam disso. Os campos estavam prenhes de frutas, e nas estradas marchavam homens que estavam morrendo de fome. Os celeiros estavam repletos, e as cianças pobres cresciam raquíticas. Em seus peitos intumesciam as pústulas escrofulosas. As grandes companhias não sabiam que era uma linha muito tênue e a linha divisória entre a fome e a ira. E o dinheiro que podia ter sido empregado em melhores salários era gasto em bombas de gás, em carabinas, em agentes e espiões, em listas negras e em exercícios bélicos. Nas estradas os homens locomoviam-se qual formigas, à procura de trabalho e de comida. E a ira começou a fermentar."
John Steinbeck em "As vinhas da ira".
Qualquer coincidência é mera semelhança:
"Olho na pressão, tá fervendo
Olho na panela
Dinamite é o feijão cozinhando
Dentro do molho dela
A bruxa mexeu o caldo
Se liga aí, ô galera
Tá pingando na mistura
Saliva da besta-fera
Chacina no centro-oeste
E guerrilha na fronteira
Emboscada na avenida
Tiro e queda na ladeira
Mas feitiço é bumerangue
Perseguindo a feiticeira"
"Na Pressão", de Lenine, Bráulio Tavares e Sérgio Natureza
segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
domingo, 18 de abril de 2010
domingo, 4 de abril de 2010
sexta-feira, 2 de abril de 2010
Mais Leminski
SINTONIA PARA PRESSA E PRESSÁGIO
Escrevia no espaço.
Hoje, grafo no tempo,
na pele, na palma, na pétala,
luz do momento.
Sôo na dúvida que separa
o silêncio de quem grita
do escândalo que cala,
no tempo, distância, praça,
que a pausa, asa, leva
para ir do percalço ao espasmo.
Eis a voz, eis o deus, eis a fala,
eis que a luz se acendeu na casa
e não cabe mais na sala.
DIONISIOS ARES AFRODITE
aos deuses mais cruéis
juventude eterna
eles nos dão de beber
na mesma taça
o vinho, o sangue e o esperma.
Escrevia no espaço.
Hoje, grafo no tempo,
na pele, na palma, na pétala,
luz do momento.
Sôo na dúvida que separa
o silêncio de quem grita
do escândalo que cala,
no tempo, distância, praça,
que a pausa, asa, leva
para ir do percalço ao espasmo.
Eis a voz, eis o deus, eis a fala,
eis que a luz se acendeu na casa
e não cabe mais na sala.
DIONISIOS ARES AFRODITE
aos deuses mais cruéis
juventude eterna
eles nos dão de beber
na mesma taça
o vinho, o sangue e o esperma.
Curitibas
Conheço esta cidade
como a palma da minha pica.
Sei onde o palácio
sei onde a fonte fica,
Só não sei da saudade
a fina flor que fabrica.
Ser, eu sei. Quem sabe,
esta cidade me significa.
p. leminski
como a palma da minha pica.
Sei onde o palácio
sei onde a fonte fica,
Só não sei da saudade
a fina flor que fabrica.
Ser, eu sei. Quem sabe,
esta cidade me significa.
p. leminski
domingo, 21 de março de 2010
Nostalgia da lama
Talvez não seja correto dizer que o esporte é um espelho da sociedade, mais a maneira como os fatos do esporte e seu entorno são lidos pela mídia certamente diz muito sobre ambas (a sociedade e a própria mídia).
O “mea culpa” do golfista Tiger Woods diante das câmeras expôs muito mais que suas infidelidades conjugais. Colocou a nu uma cultura manifestamente puritana que transforma em espetáculo midiático a repressão de suas pulsões.
Como se sabe, muitos norte-americanos, talvez a maioria, acham que gostar de sexo é uma espécie de doença.
No Brasil, a cobertura e a repercussão crítica dos recentes escândalos envolvendo os astros do futebol Adriano e Vagner Love revelam, entre outras coisas, um indisfarçável preconceito de classe.
O que mais escandaliza a chamada crônica esportiva, com honrosas exceções, parece ser o ambiente em que os personagens foram “flagrados”. A própria recorrência desse verbo é significativa, como se estar num baile funk ou simplesmente na favela fosse por si só uma atitude ilícita ou, no mínimo, suspeita.
Na Chatuva e na Barra
O vínculo entre os termos favela e crime, martelado durante décadas pelos meios de comunicação, parece ter-se tornado indissolúvel. Condena-se Adriano não tanto por trocar socos com a namorada, mas por fazê-lo no morro da Chatuva, e não numa cobertura na Barra da Tijuca ou num palacete em Milão.
O viés de classe nunca ficou tão evidente, aliás, como quando o jogador, um ano atrás, deixou de se reapresentar a seu clube, a Internazionale de Milão, e se refugiou durante três dias no bairro onde se criou, no Rio de Janeiro. A perplexidade foi geral, na imprensa e no mundo futebolístico.
A pergunta que se repetia era: como um sujeito abre a mão de milhões de euros, do destaque num clube de ponta, de uma cidade sofisticada, para voltar à favela? O corolário, explícito ou subjacente, era mais ou menos o seguinte: “Quem nasce na maloca nunca vai deixar de ser maloqueiro”.
Uma espécie de “nostalgia da lama” arrastaria Adriano para baixo – ainda que, topograficamente, para cima.
O que escandaliza, no fundo, é a recusa em aderir aos valores, condutas e discursos tornados praticamente compulsórios para quem “vence” na nossa sociedade.
Não se perdoa Vagner Love por optar por um baile funk na Rocinha em vez de uma boate na zona sul do Rio. No primeiro, estão os “bandidos”; na segunda, a gente de bem.
Pouco importa que o tráfico que mata tanta gente no morro se alimente do consumo recreativo de muitos habitués das casas noturnas chiques.
Num país de “malandros com contrato, com gravata e capital”, não escandaliza ninguém que Kaká sai publicamente em defesa dos líderes de sua argentária igreja, investigados em dois países por estelionato e lavagem de dinheiro.
Kaká, diz a crônica em uníssono, é um rapaz de boa cabeça, de boa família, de boa “estrutura”. Mas Vagner Love aparecer num baile na Rocinha ladeado por traficantes armados (algo que talvez ocorresse com qualquer celebridade que visitasse o local) é intolerável.
Motel e travestis
Para reforçar a constatação de que, entre nós, o viés de classe é ainda mais forte do que o viés moralista, um caso exemplar é o de Ronaldo, “flagrado” (olha o verbo de novo) com três travestis num motel do Rio.
O que mais se ouviu, nos bastidores da imprensa, foi: “Como é que um sujeito com grana que ele tem vai se meter com travecos de rua? Era só pegar o telefone e encomendar a perversão que quisesse, no sigilo do seu apartamento ou de um hotel de luxo”.
Ou seja, dependendo do montante gasto, do cenário e dos figurinos, tudo é bonito e aceitável.
Fonte: Texto de José Geraldo Couto, publicado na Folha de São Paulo de 21/03/10.
O “mea culpa” do golfista Tiger Woods diante das câmeras expôs muito mais que suas infidelidades conjugais. Colocou a nu uma cultura manifestamente puritana que transforma em espetáculo midiático a repressão de suas pulsões.
Como se sabe, muitos norte-americanos, talvez a maioria, acham que gostar de sexo é uma espécie de doença.
No Brasil, a cobertura e a repercussão crítica dos recentes escândalos envolvendo os astros do futebol Adriano e Vagner Love revelam, entre outras coisas, um indisfarçável preconceito de classe.
O que mais escandaliza a chamada crônica esportiva, com honrosas exceções, parece ser o ambiente em que os personagens foram “flagrados”. A própria recorrência desse verbo é significativa, como se estar num baile funk ou simplesmente na favela fosse por si só uma atitude ilícita ou, no mínimo, suspeita.
Na Chatuva e na Barra
O vínculo entre os termos favela e crime, martelado durante décadas pelos meios de comunicação, parece ter-se tornado indissolúvel. Condena-se Adriano não tanto por trocar socos com a namorada, mas por fazê-lo no morro da Chatuva, e não numa cobertura na Barra da Tijuca ou num palacete em Milão.
O viés de classe nunca ficou tão evidente, aliás, como quando o jogador, um ano atrás, deixou de se reapresentar a seu clube, a Internazionale de Milão, e se refugiou durante três dias no bairro onde se criou, no Rio de Janeiro. A perplexidade foi geral, na imprensa e no mundo futebolístico.
A pergunta que se repetia era: como um sujeito abre a mão de milhões de euros, do destaque num clube de ponta, de uma cidade sofisticada, para voltar à favela? O corolário, explícito ou subjacente, era mais ou menos o seguinte: “Quem nasce na maloca nunca vai deixar de ser maloqueiro”.
Uma espécie de “nostalgia da lama” arrastaria Adriano para baixo – ainda que, topograficamente, para cima.
O que escandaliza, no fundo, é a recusa em aderir aos valores, condutas e discursos tornados praticamente compulsórios para quem “vence” na nossa sociedade.
Não se perdoa Vagner Love por optar por um baile funk na Rocinha em vez de uma boate na zona sul do Rio. No primeiro, estão os “bandidos”; na segunda, a gente de bem.
Pouco importa que o tráfico que mata tanta gente no morro se alimente do consumo recreativo de muitos habitués das casas noturnas chiques.
Num país de “malandros com contrato, com gravata e capital”, não escandaliza ninguém que Kaká sai publicamente em defesa dos líderes de sua argentária igreja, investigados em dois países por estelionato e lavagem de dinheiro.
Kaká, diz a crônica em uníssono, é um rapaz de boa cabeça, de boa família, de boa “estrutura”. Mas Vagner Love aparecer num baile na Rocinha ladeado por traficantes armados (algo que talvez ocorresse com qualquer celebridade que visitasse o local) é intolerável.
Motel e travestis
Para reforçar a constatação de que, entre nós, o viés de classe é ainda mais forte do que o viés moralista, um caso exemplar é o de Ronaldo, “flagrado” (olha o verbo de novo) com três travestis num motel do Rio.
O que mais se ouviu, nos bastidores da imprensa, foi: “Como é que um sujeito com grana que ele tem vai se meter com travecos de rua? Era só pegar o telefone e encomendar a perversão que quisesse, no sigilo do seu apartamento ou de um hotel de luxo”.
Ou seja, dependendo do montante gasto, do cenário e dos figurinos, tudo é bonito e aceitável.
Fonte: Texto de José Geraldo Couto, publicado na Folha de São Paulo de 21/03/10.
quinta-feira, 18 de março de 2010
Não manipule meu medo
Não manipule meu medo, a minha paranóia é uma jibóia que me engole em segredo. A minha vida é uma neurose sem fim, hoje eu tomei uma overdose de mim. Me enchi o saco, aquele velho papel, de tanto engolir sapo eu cuspo cascavel.
Tirei o alarme do carro, fumei meu seguro de vida e não vou cortar o cigarro e nem vou parar com a bebida.
E não manipule meu medo, meu medo, meu medo. Meu medo filho da culpa, fobia fia da mãe, e medo fio da culpa. Hi hi Johny, hi hi Alfredo, a minha paranóia é uma jibóia que me engole em segredo...
Texto de Jean Garkunkel, transcrito do programa Radio Caos de 21/01/07, da Rádio 91 Rock.
Tirei o alarme do carro, fumei meu seguro de vida e não vou cortar o cigarro e nem vou parar com a bebida.
E não manipule meu medo, meu medo, meu medo. Meu medo filho da culpa, fobia fia da mãe, e medo fio da culpa. Hi hi Johny, hi hi Alfredo, a minha paranóia é uma jibóia que me engole em segredo...
Texto de Jean Garkunkel, transcrito do programa Radio Caos de 21/01/07, da Rádio 91 Rock.
quarta-feira, 17 de março de 2010
daquela que amo dia e noite
sonhei ter ouvido que morrera
e sonhei ter ido onde haviam enterrado a mulher que amo
mas ela não estava naquele lugar
e sonhei ter vagado a sua procura entre sepulcros para encontrá-la
e descobri que todos os lugares eram sepulcros
as casas cheias de vida
estavam igualmente cheias de morte
walt whitman (1819-1892)
sonhei ter ouvido que morrera
e sonhei ter ido onde haviam enterrado a mulher que amo
mas ela não estava naquele lugar
e sonhei ter vagado a sua procura entre sepulcros para encontrá-la
e descobri que todos os lugares eram sepulcros
as casas cheias de vida
estavam igualmente cheias de morte
walt whitman (1819-1892)
sábado, 13 de março de 2010
Cartola...
Queixo-me às rosas, mas que bobagem
As rosas não falam
Simplesmente as rosas exalam
O perfume que roubam de ti
As rosas não falam
Simplesmente as rosas exalam
O perfume que roubam de ti
quarta-feira, 10 de março de 2010
sábado, 6 de março de 2010
domingo, 28 de fevereiro de 2010
A arte sempre esteve e sempre estará na vanguarda do pensamento humano, a frente da filosofia e da ciência. A percepção, a sensibilidade humanas, vão muito além do empirismo cartesiano que domina o mundo, notadamente o ocidente. A resposta primeva, os rumos, estão em nós, nos nossos corações, e não nos instrumentos de medida que criamos.
sábado, 13 de fevereiro de 2010
Questão de Humanidade
Meio indignado, escrevi este texto para enviar aos jornais daqui de São Bento. Fica o registro aqui também:
"Não sei até que ponto pode ser de alguma utilidade vir aqui expor minhas impressões, ainda por cima de caráter subjetivo, a respeito de um serviço público, mas creio que calar-me não será de melhor valia.
Estive esta semana no Hospital Sagrada Família para ser atendido devido a uma lesão no tornozelo. Não gosto de ir a estes lugares, pois já passei outras vezes por situações desagradáveis neste e em outros estabelecimentos similares, mas a necessidade às vezes nos impele a freqüentá-los.
Enfim, tudo corria bem desde quando fui atendido pelo funcionário da recepção e depois pelas enfermeiras, até que chegou o momento do exame pelo médico. O referido profissional me fez um par de rápidas perguntas, olhou de soslaio para meu paquidérmico tornozelo esquerdo, e encaminhou-me ao raio-x. Coisa de dois ou três minutos, mas tudo bem pensei, depois retornarei com os negativos para concluir a consulta. Fui atendido no setor de radiografias (por sinal muito bem atendido) e retornei até a sala do médico com os negativos em mãos. Mais outros dois a três minutos e o mesmo já havia examinado o resultado do raio-x, receitou-me um medicamento e encaminhou-me para imobilizar o local da lesão. Ainda tentei tecer algumas considerações e perguntas, mas as atitudes do médico foram tão rápidas que me deixaram meio atônito, como num repentino assalto. A consulta encerrou-se comigo ainda tentando dizer algo (que já não me lembro do que se tratava) e o profissional levantando-se de sua cadeira e, sem me dar ouvidos, precipitando-se rapidamente pelos corredores do estabelecimento. Saí da sala após ele, com um sentimento algo como de ter sido assaltado mesmo, assaltado de meu direito de ser informado sobre meu estado de saúde, entre outras coisas... Saí sem saber quanto tempo deveria ficar com o tornozelo imobilizado, ou se deveria voltar para novo exame. Descobri pela atendente da farmácia qual era a dosagem diária que devo ingerir do medicamento que me foi receitado, dosagem esta que não corresponde à indicada na bula. Agora estou na dúvida se ligo para o médico perguntar quem está correto. Descobri através das enfermeiras, que leram no verso da receita redigida pelo médico, que eu deveria marcar uma nova consulta com um ortopedista (escritos estes que eu jamais teria conseguido decifrar sozinho, sem que estas funcionárias, coincidentemente, lessem a dita lauda). Aliás, a consulta com o tal ortopedista somente está disponível a partir do dia 23 deste mês, quando minha lesão já estará curada, espero, ou senão um tanto quanto agravada provavelmente.
Digo tudo isto não com o intuito de questionar os procedimentos médicos aos quais fui submetido, assunto sobre o qual sou inteiramente leigo. O que senti falta e não consegui identificar em nenhum momento da consulta médica é algo já meio démodé, que se chama HUMANIDADE. Compreendo que talvez possam faltar recursos ou infra-estrutura, mas consideração e humanidade não são vendidos a granel ou a quilo, e não têm custo nenhum. Aliás, recursos certamente não faltam na remuneração recebida por este profissional, maior do que a da imensa maioria de nossa população, inclusive que a minha. E friso novamente que fui muito bem atendido por todo o restante da equipe, mas justamente aquele profissional que seria o mais gabaritado para cuidar daquilo que chamamos de vida humana, pecou neste sentido. Meus animais domésticos, quando levados até o veterinário que os atende, são tratados muito mais humanamente. O veterinário até conversa com eles! E eu não tive sucesso ao tentar me comunicar com um médico...
Em resumo, sou grato por poder ter sido atendido sem custos (aspas aí, pois pago meus impostos) por estes profissionais, mas existem outras atitudes, ou chamemos até “procedimentos”, que tornam nossas vidas mais leves e que não fazem parte da grade curricular das universidades. Estes são aprendidos no convívio social, especialmente nos lares de cada um. E talvez eu seja um idealista, mas creio sinceramente que aquele “tempero” de que precisamos para tornar nossas vidas menos insossas e mais agradáveis está sendo negado a alguns e por alguns."
"Não sei até que ponto pode ser de alguma utilidade vir aqui expor minhas impressões, ainda por cima de caráter subjetivo, a respeito de um serviço público, mas creio que calar-me não será de melhor valia.
Estive esta semana no Hospital Sagrada Família para ser atendido devido a uma lesão no tornozelo. Não gosto de ir a estes lugares, pois já passei outras vezes por situações desagradáveis neste e em outros estabelecimentos similares, mas a necessidade às vezes nos impele a freqüentá-los.
Enfim, tudo corria bem desde quando fui atendido pelo funcionário da recepção e depois pelas enfermeiras, até que chegou o momento do exame pelo médico. O referido profissional me fez um par de rápidas perguntas, olhou de soslaio para meu paquidérmico tornozelo esquerdo, e encaminhou-me ao raio-x. Coisa de dois ou três minutos, mas tudo bem pensei, depois retornarei com os negativos para concluir a consulta. Fui atendido no setor de radiografias (por sinal muito bem atendido) e retornei até a sala do médico com os negativos em mãos. Mais outros dois a três minutos e o mesmo já havia examinado o resultado do raio-x, receitou-me um medicamento e encaminhou-me para imobilizar o local da lesão. Ainda tentei tecer algumas considerações e perguntas, mas as atitudes do médico foram tão rápidas que me deixaram meio atônito, como num repentino assalto. A consulta encerrou-se comigo ainda tentando dizer algo (que já não me lembro do que se tratava) e o profissional levantando-se de sua cadeira e, sem me dar ouvidos, precipitando-se rapidamente pelos corredores do estabelecimento. Saí da sala após ele, com um sentimento algo como de ter sido assaltado mesmo, assaltado de meu direito de ser informado sobre meu estado de saúde, entre outras coisas... Saí sem saber quanto tempo deveria ficar com o tornozelo imobilizado, ou se deveria voltar para novo exame. Descobri pela atendente da farmácia qual era a dosagem diária que devo ingerir do medicamento que me foi receitado, dosagem esta que não corresponde à indicada na bula. Agora estou na dúvida se ligo para o médico perguntar quem está correto. Descobri através das enfermeiras, que leram no verso da receita redigida pelo médico, que eu deveria marcar uma nova consulta com um ortopedista (escritos estes que eu jamais teria conseguido decifrar sozinho, sem que estas funcionárias, coincidentemente, lessem a dita lauda). Aliás, a consulta com o tal ortopedista somente está disponível a partir do dia 23 deste mês, quando minha lesão já estará curada, espero, ou senão um tanto quanto agravada provavelmente.
Digo tudo isto não com o intuito de questionar os procedimentos médicos aos quais fui submetido, assunto sobre o qual sou inteiramente leigo. O que senti falta e não consegui identificar em nenhum momento da consulta médica é algo já meio démodé, que se chama HUMANIDADE. Compreendo que talvez possam faltar recursos ou infra-estrutura, mas consideração e humanidade não são vendidos a granel ou a quilo, e não têm custo nenhum. Aliás, recursos certamente não faltam na remuneração recebida por este profissional, maior do que a da imensa maioria de nossa população, inclusive que a minha. E friso novamente que fui muito bem atendido por todo o restante da equipe, mas justamente aquele profissional que seria o mais gabaritado para cuidar daquilo que chamamos de vida humana, pecou neste sentido. Meus animais domésticos, quando levados até o veterinário que os atende, são tratados muito mais humanamente. O veterinário até conversa com eles! E eu não tive sucesso ao tentar me comunicar com um médico...
Em resumo, sou grato por poder ter sido atendido sem custos (aspas aí, pois pago meus impostos) por estes profissionais, mas existem outras atitudes, ou chamemos até “procedimentos”, que tornam nossas vidas mais leves e que não fazem parte da grade curricular das universidades. Estes são aprendidos no convívio social, especialmente nos lares de cada um. E talvez eu seja um idealista, mas creio sinceramente que aquele “tempero” de que precisamos para tornar nossas vidas menos insossas e mais agradáveis está sendo negado a alguns e por alguns."
Assinar:
Postagens (Atom)